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HOMENAGEM A GERARDO DE MELO MOURÃO

 

Victor Emanuel Vilela Barbuy

 

Deixou de bater o coração daquele que foi o último grande bardo vivo do Brasil. Faleceu no dia 09 de março, no Rio de Janeiro, aos noventa anos, o magno escritor, poeta, romancista e jornalista Gerardo de Melo Mourão.

O Ceará, o Sertão, o Nordeste, o Brasil, a América, o Mundo Lusófono, a Hispanidade e a Latinidade perdem, com a partida de Melo Mourão para a Milícia do Além, um de seus mais brilhantes escritores e pensadores.

Um dos mais respeitados e admirados autores brasileiros no exterior, Gerardo de Melo Mourão foi indicado ao Prêmio Nobel em 1979, havendo sido sua inscrição realizada pela New York University, e recebeu elogios de poetas do quilate de um Octavio Paz, de um Pablo Neruda, um Michel Deguy e até mesmo de um Ezra Pound. Este último, considerado por Melo Mourão como o maior poeta dos últimos séculos, assim escreveu: “Toda a minha obra foi uma tentativa de escrever a epopéia da América. Não o consegui. Ela foi escrita no poema espantoso do poeta do País dos Mourões.”

Em nosso País, a despeito do silêncio criminoso de alguns escravos do preconceito ideológico, que jamais o perdoaram por haver militado na Ação Integralista Brasileira, Melo Mourão e sua obra tiveram seu valor reconhecido por críticos do porte de um Wilson Martins, que chamou seu livro “Invenção do Mar” de “Os Brasilíadas”, numa comparação com “Os Lusíadas” de Camões, e por escritores da estirpe de um José Cândido de Carvalho, de um Octavio de Faria e de um Carlos Drummond de Andrade, que declarou-se “possuído de uma violenta admiração pelo imenso, dramático e vigoroso painel” da poesia de Gerardo de Melo Mourão.

Foi o mesmo Carlos Drummond de Andrade quem, diante de “O País dos Mourões”, comovidamente exclamou: “Esta poesia foi tudo quanto sempre desejei escrever na vida, e nunca tive força. Gerardo de Melo Mourão teve.” E foi, ainda, o mesmo Carlos Drummond de Andrade quem reconheceu: “O grande poeta de Minas Gerais não sou eu: - é o espantoso poeta Dantas Mota.

O grande poeta do Brasil também não sou eu: - é o nordestino Gerardo de Melo Mourão. Sempre sonhei chegar à poesia a que ele chegou. Não tive força. Ele teve.”

Observou Afonso Botelho que “a poesia da língua portuguesa passou a sustentar-se sobre quatro pilares: Camões, Pessoa, a carta de Caminha e Gerardo”.

De toda a obra poética de Gerardo, que foi eleito, em 1997, pela Guilda Órfica, o poeta do século XX, destaco – além do autêntico “Os Brasilíadas” que é “A Invenção do Mar”, livro dedicado a Luiz Gonzaga, o “Homero sertanejo” – a trilogia épica “Os Peãs”, composta por “O País dos Mourões”, “Peripécia de Gerardo” e “Rastro de Apolo”.

Outra das obras-primas do grande escritor cearense é “O Valete de Espadas”, que, considerado o primeiro romance expressionista de nossa Literatura, foi escrito enquanto o autor se encontrava injustamente preso. Por falar em prisões injustas, foi Gerardo preso injustamente por dezoito vezes, durante o Estado Novo de Getúlio Vargas e o Governo Militar, que também cassou seu mandato de Deputado Federal.

“O Valete de Espadas” foi escrito, bem como as dez elegias da obra “Cabo das Tormentas”, na ocasião em que Gerardo, acusado de ser um espião nazista pela ditadura estadonovista de Vargas, permaneceu encarceirado por quase seis anos, até ser libertado em razão de um apelo de intelectuais franceses liderados por Jean Paul Sartre, Simone de Beauvoir e Albert Camus, cuja peça teatral “Calígula” Gerardo traduziu para o nosso idioma.

Cearense quatrocentão e católico apostólico romano tradicionalista, Gerardo de Melo Mourão nasceu em Ipueiras, ao pé da Serra da Ibiapaba, a 08 de janeiro de 1917. Menino ainda, deixou o seu ensolarado “país do Grande Ceará” e seguiu para o Sul, onde estudou no célebre Seminário Redentorista de Congonhas do Campo, em Minas Gerais, e no Convento da Glória.

Melo Mourão já havia desistido da vida monástica, quando, no Rio de Janeiro, encontrou-se com Alceu Amoroso Lima, o Tristão de Athayde, que o aconselhou a entrar para o Integralismo, movimento cívico-político oficialmente criado a 07 de outubro de 1932, quando o eminente escritor, romancista, jornalista e político Plínio Salgado lera, no Teatro Municipal de São Paulo, o seu chamado Manifesto de Outubro.

Embora tenha sofrido, em razão de sua filiação ao Integralismo, as piores perseguições, Gerardo de Melo Mourão declarou: “Não tenho do que me arrepender, participei do mais fascinante grupo da inteligência do País.” Deste grupo que reuniu inúmeras centenas de intelectuais do mais alto valor e projeção, incluindo personagens como Gustavo Barroso, Miguel Reale, Olbiano de Mello, San Thiago Dantas, Madeira de Freitas, Câmara Cascudo, Adonias Filho, Herbert Parentes Fortes, Goffredo e Ignacio da Silva Telles, Ribeiro Couto, Alfredo Buzaid, Rubem Nogueira, Hélio Vianna, Antônio Gallotti, Américo Jacobina Lacombe, Thiers Martins Moreira, Pe. Hélder Câmara, Rui de Arruda Camargo, Ernani Silva Bruno, Raymundo Padilha, Raimundo Barbosa Lima, José Loureiro Júnior, Belisário Penna, Alcibíades Delamare, João Carlos Fairbanks, Guerreiro Ramos, Abdias do Nascimento, José Lins do Rego, Jayme Ferreira da Silva, Tasso da Silveira, Augusto Frederico Schmidt, Vinícius de Moraes, Paulo Fleming, Francisco Karam e Dantas Mota - aquele que Carlos Drummond de Andrade considerava o maior poeta mineiro -, dentre tantos outros não menos importantes.

Neste momento de profundo pesar pelo falecimento de Gerardo de Melo Mourão, consolo-me em saber que ele será para sempre lembrado como um dos maiores escritores da Língua Portuguesa e espero que Deus suscite, na atual geração e nas gerações vindouras, homens do valor de Gerardo, para que o Brasil possa ser a Grande Nação com que sonhou aquele nobre bardo da Província de José de Alencar, Antônio Conselheiro, Farias Brito e Gustavo Barroso.

 

Victor Emanuel Vilela Barbuy é escritor e crítico literário.