A Dimensão do Mito
Reza a tradição que um dia, no século
XVII, a Vila de Piratininga amanhece embandeirada. Corria, de boca em boca,
notícia que D. Sebastião voltava de Alcácer Quibir e surgiria em nosso planalto
com seus companheiros sumidos na trágica jornada do Marrocos.
Bandeirismo e Sebastianismo sempre estiveram juntos, a
começar pelo nome do “Encoberto”, presente no batismo dos futuros sertanistas.
Sebastião Preto, Sebastião de Freitas, Sebastião Paes de Barros, Sebastião de
Camargo, Sebastião Leme do Prado, Sebastião Pinheiro Raposo, o patriarca
Sebastião de Arruda Botelho e muitos outros, nascem sob o signo que finaliza em
glória o ciclo das lanças em África, da dinastia de Avis.
A lenda de D. Sebastião pode ser encontrada nas mais
diversas regiões do país. Faz parte de cavalhadas e de danças, de cantos
populares e da religiosidade de rituais emergentes do folclore. Se, por um lado
ele atirou Portugal em mãoscastelhanas, do outro, sua lenda armou o patriotismo
português na restauração das Braganças.
Na neblina que caía sobre o burgo mameluco, havia a
expectativa do rei surgir do encantamento.
O mesmo acontecia com bandeirantes jamais retornados do
sertão onde permanecem debaixo de sortilégios.
Nas monções, corriam histórias das canoas fantasmas que
transportavam tripulações dizimadas pelos paiaguás. Relatos monçoeiros alertam
sobre aparições surgidas na curva dos rios, em noites de lua cheia, com
banqueiros transparentes e sertanistas hirtos.
Em universos paralelos, D. Sebastião e bandeirantes,
aguardam.
Na névoa que desce sobre ruas de São Paulo, o sonho do
Quinto Império flutua com o séqüito de gibões que seguem a armadura vazia do
Esperado.
Paulo Bomfim é escritor, assessor de relações públicas da presidência do Tribunal de Justiça de São Paulo e membro da Academia Paulista de Letras.