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Jeanette Rozsas é ficcionista que escreve
com grande espontaneidade. Não diz isto muita coisa, levanto-se
em conta que muitos escritores de valor assim se comportam. O que se dá é que,
em Jeanette, a espontaneidade se envolve em
sutilezas, pequenos mistérios e sustos. Tudo isto ao correr da narração, sem
ênfase ou impactos maiores.
Eis porque
as emoções, aqui, palpitam fortemente, nascidas da vida cotidiana,
tão plenas de surpresas e de fragilidades continuadas.
É uma maneira curiosa de contar, quase em conversa despretensiosa.
E é aí onde se ilumina cada história, com perplexidades e surpresas criadoras,
que calam fundo na alma do leitor; e é aí onde o psicológico, irmanado ao
correr das histórias, não se revela de todo, antes se corporifica em sombra ou
aura, benfaseja ou malfaseja,
conforme o tema abordado, da primeira à última frase de cada conto e do livro
no seu todo.
A autora conta como quem “não quer dizer nada com isto”, tal
a simplicidade do seu mistério criador. Mas o seu talento treliça e destreliça situações plenas de sensações dos desencontros
da vida.
Sempre em meios-tons, centrando-se mais no “panorama” da
classe média de aparência bem comportada e sem acidentes maiores, Jeanette extrai o sal da terra e expõe aos olhos de todos
os entrechoques humanos.
Com estas poucas ferramentas nos mostra de que barro somos
feitos. Não põe dedos em feridas. Põe dedos para dedilhar as emoções que se
guardam, às vezes, em tantos falsos segredos. Tais segredos irrevelados,
quantas vezes por imposições sociais, levam a autora a envolver algumas
histórias em fumos (como diria Mestre Machado) de mistérios, em solidões
em família, em hesitações e aflições amorosas, aprofundando, muito mais e ao revez, a realidade das próprias histórias.
Em alguns contos a autora se alonga mais e em
outros é elíptica, o que é mais uma demonstração, para além do tema abordado,
do seu domínio total do gênero. Qual é mesmo o caminho de Swann? é uma pequena obra-prima da arte de contar. E o
que dizer de Setsuan e de Violoncelo? O que dizer, enfim, de cada uma destas peças
curtas? A variedade de emoções e perplexidades é muito grande. É o amor, o
desamor, o mistério, a insegurança, a solidão etc., tudo dentro de um voleio de sortilégios e buscas de alguma coisa, quanta vez
não localizável, porque são buscas da alma humana. A paisagem, o visual, os
ambientes, são sempre nitidamentes impressionistas, e
por trás desse abrir de cortina pulsa o universo de conflitos miúdos
marcadamente universais.
Jeanette Rozsas
pouco muda o tom e o tônus narrativo, seja na primeira ou
terceira pessoa. O que muda - e como muda... - é o enfoque emocional; o que exsurge são os achados, os detalhes rápidos, às
vezes numa linha apenas, ampliando grandemente o veio ficcional. É do talento
da autora, quase diria do seu inconsciente criador.
Qual é mesmo o caminho de Swann?
é ponto alto da melhor ficção curta da atualidade. Obra que pede melhor atenção
da crítica e do público ledor da boa literatura nacional.
É tão fácil comprovar... Bastará ler o livro.
(Editora 7 Letras (coleção rocinante),
Rio, 2005).
Caio Porfírio Carneiro é escritor, crítico literário e
secretário administrativo da União Brasileira de Escritores.