PAULINHA
Dimas Macedo
A boca de Paulinha
foi quem primeiro me chamou a atenção. Em seguida, os seus dentes me lamberam o
dorso e os seus lábios me morderam a face. Senti um calafrio na alma e um
delírio se apoderou de mim de forma totalmente nova.
Comecei
a tremer. Primeiro as pernas, que são a parte do corpo
por onde começo a sentir a presença confortante de Eros. Depois, os tremores
frios começaram a fervilhar o abdome, alastrando-se pelo busto e me deixando
levemente sem jeito.
Paulinha percebia a
minha agitação pessoal e sorria, mostando-me o
frescor dos seus dentes alvos, a sensualidade dos seus dedos longos, que se
mostravam plenos, para que eu visse que ela não tinha compromisso, nem com a
vida, nem com os homens que ela havia amado no passado.
Acho
que os homens – a maioria dos homens – não sabem o que são as formas de um
corpo num Salão de Beleza. As formas, nesses lugares claros e, no geral,
agitados, são arredondadas e curvas e suas linhas apontam para nossas retinas
buliçosas, formando línguas de fogo que nos queimam a emoção secreta da
palavra.
Os
homens, desgraçadamente, não costumam freqüentar os Salões de Beleza. E
geralmente não sabem o que é amar uma mulher para além do sexo genital e das
suas tensões aflitivas. Buscam sempre a ilusão torpe do orgasmo, mas não
conseguem enxergar a beleza das formas inefáveis de um corpo.
Falam
de um certo tesão pelas mulheres e acham que podem possuir a todas
indistintamente, mas não se possuem sequer a si próprios nas suas horas de
intimidade. Acham que um membro viril é tudo o que uma mulher deseja. E que a
masculinidade se afirma pelo ponto de vista biológico.
Penso
que o lado feminino de um homem e a sua maneira sensível de contemplar o corpo
e a alma da mulher é o que faz a diferença. As mulheres nasceram para possuir
os homens e não para serem contestadas em suas decisões de gênio e de vontade.
Nasceram para serem amadas e servidas e não para serem tratadas como se fossem
objetos de uso.
Pobres
homens, os que não andam em Salões de Beleza! Leigos os que não assumem a sua
porção feminina, os que não vêem a magia e os mistérios abissais da alma
feminina!
Paulinha me ensinou tudo
isso desde que os seus olhos de lince se projetaram em mim e despertaram
a minha borbulhante sensibilidade. Desde quando a sua face de deusa
passou a esculpir as estrelas de nuvem do meu corpo, eriçando-me os pelos
levemente molhados.
Hoje,
se os lábios de Paulinha permitissem, eu renunciaria
a tudo pelo seu amor. Aceitaria ser o seu escravo. Pagaria as
suas contas bancárias e as suas despesas em todas as lojas e butiques. E
tudo o mais faria pela sua atenção. E morreria talvez se me fosse dado
contemplar as rosas de sangue do seu púbis.
O
corpo todo de Paulinha. A alma toda de Paulinha. A sua voz de plumas a ruminar chicletes e
palavras. Ah! Se tudo isso me fosse permitido, eu não mais sentiria a sua
ausência em noites de vigília que me deixam totalmente pasmo de desejos.
Eu
juro que faria dos pés de Paulinha o meu santuário de
todos os momentos. Faria dos seus dedos o principio das minhas conquistas
diuturnas. Esculpiria o seu busto em mármore de carrara
e ornaria o seu dorso com as esmeraldas mais caras do mercado. E de
contentamento morreria se Paulinha dissesse, ao
menos, que eu tenho a chance de ouvir as suas negativas e os seus pedidos para
que me torne uma ausência total em sua vida.
E
se glória seria para mim viver dessa maneira, imagine
o leitor que triunfo supremo não seria eu poder gozar da atenção de Paulinha, ouvindo seus pedidos insistentes para que me
deite por sobre suas pernas ou ao lado do seu corpo faminto, completamente
úmido de sais e de resinas.
Dimas Macedo é escritor, crítico literário, professor e membro da Academia Cearense de Letras.