Paulo Dantas - o Jagunço Menino
Rosani
Abou Adal
Paulo Dantas, escritor,
ensaísta, crítico literário, romancista, ficcionista, biógrafo, jornalista,
vice-presidente da Academia de Letras de Campos do Jordão, presidente da
Academia Brasileira de Literatura Infanto-Juvenil, nasceu em 1922 em Simão
Dias, SE, completou 85 anos no dia 13 de janeiro. Autor de vasta obra, detentor
dos prêmios Coelho Neto e Afonso Arinos, da Academia Brasileira
de Letras; Mário Sete, do Jornal de Letras; do Pen Clube,
de São Paulo; e do Fernando Chináglia. O “menino jagunço?cria, com a
alma, personagens vivos, que deixam fortes marcas na nossa Literatura. Paulo
Dantas encanta com suas Joanas Imaginárias. Tem um estilo próprio e conciso.
A linguagem dantasiana ?sua marca. Seus livros de biografias, importantes aos
estudiosos e pesquisadores, e toda sua obra necessita de reedições. A maioria
dos seus livros est?com edições esgotadas e nossa Literatura enferma sem os
títulos e os personagens do jagunço-menino. Entrevistamos o autor de As
Águas não Dormem em homenagem ao homem sensível e ao intelectual de valor
incalculável às nossas Letras. Ele nunca dormiu produzindo sua obra. Esperamos
que os editores também não durmam e reeditem seus livros.
- O que
significa completar 85 anos e quais são suas perspectivas?
- Nasci no
ano da Semana de Arte Moderna de 1922 e da fundação do Partido
Comunista. E a lobatina Emília gritando independência ou morte. Estou na
terceira infância, agora marcho para a velhice com ordem e progresso. Amar e
querer bem a Deus e ao mundo e procurar os heróis do nosso tempo.
- Quais são
os referidos heróis?
- Bernardo
Saião - estradeiro-mor da Belém-Brasília; Antonio Conselheiro, professor
místico dos Sertões; e Euclides da Cunha, sertanejo antes de tudo forte. Não
posso me esquecer de Padre Cícero na oração e de Lampião na valentia e no
trabalho; do precursor da industrialização brasileira, Belmiro Gouveia. Muitos
outros heróis existem, que não cultuo para não cair no pecado da omissão. Um
herói nunca morre, planta e colhe dobrado no chão social dessa pátria
estremecida.
- O que
estes heróis influenciaram na sua vida e Literatura?
-
Identificações espirituais, ensinamentos e alumbramentos. Escrevi biografias Jovens
para todo o mundo. Ser ou não ser sertanejo, eis a questão. Todo brasileiro
no fundo ?um sertanejo. Assim foi o urbano Monteiro Lobato e at?o universal
Guimarães Rosa, amigo, meu camarada, companheiro dos encantos, dos arrancos e
dos espantos. Deus me deu a graça de inumeráveis amigos. Inspiração para
escrever livros biográficos cheios de lições nacionalistas e patrióticas. Não
faço pesquisa porque abraço o encantamento. O encantamento ?emocional e,
assim, me levou para as páginas do meu Através dos Sertões.
- O que
significa o sertão?
- O sertão ?
minha infância e meu embasamento nacional. Nos dias da minha mocidade escrevi
memórias dos desperdícios amorosos. Minha mãe, Maria Bonita e Anita Garibaldi
representam a identificação e o chão do sertão. Mulheres rendeiras tecem sonhos
e ilusões.
?/span>- Quais são os planos para 2007?
- Viver,
resistir e escrever porque não escrever ?morrer. Tudo de bom acontece no
amanhecer de cada dia. Escrevo de madrugada porque as energias estão
recuperadas em minha alma.
- Voc?pretende
lançar livro novo?
- Espero
escrever essas minhas memórias tão anunciadas, Poeiramas, achados e
perdidos, gira-gira gitirana. Às vezes penso que estou escrevendo essas
memórias por estar praticando um misto-quente, nele cabendo tudo. Crônicas, contos,
poesias, romances ou novelas inacabadas.Hoje leio mais do que escrevo. Muito
escrevi e ainda por teimosia, que os leitores tenham paciência, talvez venham
novos livros.
- O que
representa o Poeiramas?
- Cada livro
possui um destino, sendo um grito ou um desabafo, iluminando nossos fantasmas.
Sejam ou não familiares. No teatro giratório dos meus navios a navegar, sinto
as cargas descendo dos sertões.
- Qual ?seu
melhor livro?
- O Livro
de Daniel, o meu romance mais trabalhado. Levei 12 anos na sua elaboração.
Este penso seja meu melhor livro, apenas tendo uma edição comemorativa na
Editora Francisco Alves quando dos anos 60; criei sem saber muitas teorias
literárias. Uma delas fez sucesso, a do calado pertencido, que cada homem ?um
navio tendo ostras e cicatrizes no seu calado, que às vezes se torna consentido
quando a gente aceita vitórias e derrotas. O Livro de Daniel teve
cinco mil exemplares e est?precisando de uma editora que queira investir no
romance brasileiro.
- Qual personagem
criou com que mais se identifica?
- ?o
Daniel.?Guimarães Rosa disse que Daniel
?um gênio ignorado.
- Qual ?o
personagem mais feliz?
- ?o Capitão
Jagunço.Escrevi o livro em um mês, estava muito inspirado.
- Qual ?sua
fonte de inspiração?
- A vida
viva, a experiência experimentada. Para que dizer mais, isto j?diz tudo. Agora
esbarro com o meu clássico - “viva? Viva a Linguagem Viva!
- O que
representa Aquelas Muralhas Cinzentas?
- Foi meu livro de estréia,
escrito no raiar da mocidade, inspirado diretamente nos seis meses que convivi
com os presos da penitenciária agrícola de Neves, dirigida pelo político
mineiro Jos?Maria de Alckmin. Uma estréia feliz bem aceita pela crítica e
livraria. At?ganhou um prêmio espontâneo da Academia Brasileira de Letras. ?/span>Influenciado pelas recordações da Casa dos
Mortos, de Dostoievski, antes das Memórias do Cárcere, de
Graciliano, dava minha humilde contribuição ao tema carceral.
- Em que época escreveu os
livros As Águas não Dormem, Purgatório, Chão de Infância e Cidade
Enferma?
- Nos dias da minha mocidade ferida com minhas
experiências no Rio e nos sanatórios, escrevi a novela As Águas não Dormem,
que at?teve repercussão em Portugal. Curado, um dia fui procurar meu amigo
Manuel Bandeira, que foi tuberculoso profissional, falou para desistir da
tuberculose que ela não mais existia. Bem curado fui buscar meu Chão de
Infância. Morando no bairro do Paraíso escrevi o romance Purgatório. Depois
de alcançar o máximo atingi os enredos trágicos e amorosos do meu romance Cidade
Enferma, premiado com o Prêmio Coelho Neto, da ABL.
- Voc?publicou um livro com o
tema Cangaceiro?
- Publiquei o livro Lampião,
com capa de Edgar Kates, uma rapsódia, peça teatral, que levei para a exposição
do Aldemir Martins.
- Por que o título Vozes do
Tempo de Lobato?
- Quem deu o título foi o
barroco?Mário Graciotti, diretor do
Clube do Livro. Ele quem me divulgou em todo o Brasil. O livro ficou esgotado,
pois Carlos, da Editora Traço, soube distribu?lo bem.
- Fale do
seu trabalho na Francisco Alves e sobre as obras que editou?
- Na década
de 60, a convite de Lélio Castro Andrade, trabalhei na Francisco Alves. Editei
Clarice Lispector, Osório Castro Alves e dirigi a Coleção Alvorada, que
publicou Caio Porfírio Carneiro, Jorge Medauar, Hernâni Donato, Herman Jos?
Heipert, Carlos Lacerda, Barbosa Lessa, Moacir C. Lopes, Felício dos Santos e
Paulo Dantas.
- Fale da
sua atuação no Museu da Literatura, no Vale do Paraíba e entre outros locais
que trabalhou?
- Trabalhei
junto com voc?no Museu da Literatura. Fui diretor cultural da Casa Guilherme
de Almeida. Atuei como delegado regional na Secretaria de Estado da Cultura, em
Bauru, Agudos, Lençóis Paulista. Minha atuação no Vale do Paraíba foi lutando
pela implantação do Sítio do Pica-Pau. Atuei como professor do Centro de
Estudos Euclides da Cunha nos colégios de São Jos?do Rio Pardo - berço
nacional dos Sertões.
- Como foi sua
amizade com Monteiro Lobato? E como o conheceu?
- Amizade
feita pelo sofrimento por ele ter sido pai bastardo e ter me dado ajuda
espiritual e financeira. Ele não me deixou cair. Havia uma estranha
coincidência de ser parecido com seu filho Guilherme, tuberculoso falecido aos
24 anos, com a idade que cheguei l? Conheci Lobato em São Paulo e ele me
mandou para Campos do Jordão. Quando Lobato morreu foi como se eu tivesse
perdido um pai. Foi ele quem me levou para a Brasiliense.
- O que voc?
tem de semelhança com Monteiro Lobato?
- O
Humanismo e a denúncia, o patriotismo, o nacionalismo e imaginário infantil. O
caráter palpável - lamentando atualmente não exista um escritor como ele. Ser?
que a inteligência est?acabando?
- Qual sua
semelhança com o filho de Lobato?
- Quando
Lobato me mostrou o álbum de família, vi o retrato de Guilherme e tive um susto
hereditário.
- Como voc?
v?Monteiro Lobato e como se identifica?
- Como um
protetor, estimulador, uma força telúrica, coração brasileiro universal e
dadivoso. Tenho encontrado nele uma espécie de identificação sofrida. Ser?para
sempre uma amizade na eternidade. Ainda o vejo baixinho no tamanho, andando
sozinho de sobretudo no viaduto. Parecia um homem orgulhoso, grosso engano. Ele
caminhava conduzindo nos ombros sorte para todos os problemas nacionais,
gritando por uma imediata solução.
- Que mensagem d?para os
novos autores?
-
Ler mais porque a leitura s?
pode fazer bem nas influências recebidas. O escritor quando tem personalidade
sabe se expressar e, num estilo vigoroso, abre a porta dando entrada ?
sinceridade acima de tudo. Tem de ser um homem, cidadão sem nenhuma suspeita. Suspeita
?desconfiança. Vamos todos ?cada um, escritor, dono do seu estilo, comunicar
nossas mensagens.
Rosani Abou Adal ?escritora, jornalista, membro da
Academia de Letras de Campos do Jordão.